Agrotóxico pode "salvar" Parque das Emas
Notícia veiculada no site da Federação de Agricultura de Goiás em 30 de Março de 2011 aponta esta "inovação tecnológica" como possível solução para acabar com pragas exóticas, principalmente a braquiária...
O que é melhor para uma área de proteção ambiental infestada por pragas: deixar que a natureza se reequilibre sozinha ou usar agrotóxicos para dar uma mãozinha a ela? A partir do mês que vem, o Parque Nacional das Emas apostará na segunda alternativa para tentar impedir o que os seus funcionários anunciam como um desastre ambiental inevitável.
Com 132 mil hectares cravados no Estado de Goiás, na divisa com Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Emas é uma das maiores unidades de conservação do Cerrado brasileiro, mas corre o risco de ver o ecossistema local entrar em colapso com o avanço agressivo de algumas plantas exóticas.
Um estudo encomendado pela administração do parque no ano passado apontou que 10% de sua área já está comprometida com a braquiária, um tipo de capim africano introduzido no Brasil décadas atrás para a alimentação do gado. O restante do parque tem fragmentos espalhados não só de braquiária, mas de outros quatro tipos de capim, como o andropolgo, de rápida expansão.
"Esse é o drama: o que acontecerá quando as gramíneas dominarem o parque?", diz Marcos Cunha, administrador de Emas
...leia a reportagem completa no site da FAEGPaulo Cezar Mendes Ramos Ph D - Analista ambiental (Parque Nacional de Brasília) enviou a carta abaixo ao ICMBIO apontando os erros que podem advir desta maluquice, vejamos as considerações que ele fez..
Caros dirigentes e colegas do ICMBIO,
Tomei ciência através de notícia da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás, sobre a decisão desastrosa tomada por dirigentes do ICMBIO. O uso proibido de venenos herbicidas em Parques Nacionais. Um precedente nunca antes praticado, um risco inestimado que pode resultar em consequências desastrosas.
Acredito estarem a cometer um "suicídio científico" patrocinado pela Monsanto.
O ICMBIO e as pessoas que comandam este pocessso poderão responder no futuro por suas decisões, que considero equivocadas.
Trabalhos científicos mostram os malefícios do roundup que são simplesmente desconsiderados pelo ICMBIO.
Desastrosa decisão, trocar gramíneas por veneno!
Como já expressei à colega Kátia Torres, as áreas protegidas necessitam de brigadas de controle de espécies invasoras e não de venenos. Querer tentar erradicação rápida - uma falta de visão estratégica e de paciência. As omissões, as ações mal planejadas e mal executadas passam a servir de argumento para desastrosos precedentes. Obviamente o uso de herbicida é defendido pelos técnicos e dirigentes da Monsanto (texto da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás abaixo).
Assim como estamos fazendo com os incêndios florestais em nossas unidades de conservação - com os trabalhos das brigadas, podemos perfeitamente fazer com as espécies exóticas invasoras. Com estratégias de controle mecânico das invasoras, dispersão das espécies autóctones e educação no entorno das UCs podemos chegar a um coeficiente bastante aceitável de tolerância:
Autóctones/Invasoras = ..X.
Percentual, relação de cobertura, ou outra medida qualquer que precisamos definir. Devemos estabelecer uma tolerância máxima para as espécies invasoras. Podemos até conseguir erradicações, mas sem ações extremadas.
Instituições oficiais persistem em introduzir espécies exóticas invasoras para uso na agropecuária o que torna as infestações inevitáveis. Os usos das espécies invasoras junto aos limites das UCs contribuem para a dispersão dos vetores dessas espécies. As reinfestações são fartamente registradas em todo o mundo, portanto, a precaução deve ser a tônica para a tomada de decisões.
As práticas equivocadas de abertura de aceiros para o controle do fogo no Parque Nacional das Emas no passado, com a abertura de estradas e queima da vegetação entre as estradas criaram corredores para o ingresso das gramíneas exóticas invasoras. Nossa falta de atenção e desconhecimento é que tem gerado as infestações. As espécies invasoras têm sido favorecidas por acidentes mas, principalmente por nossos erros. Vamos agora tentar remediar com outro grande erro?
Com trinta e cinco anos dedicados a causa da proteção da biodiversidade e das Unidades de Conservação sinto-me impelido a deixar aqui registrado o meu protesto contra a utilização de roundup ou qq outro veneno herbicida para o controle de gramíneas invasoras nas Unidades de Conservação. Os efeitos nocivos dos herbicidas já conhecidos para os microorganismos dos solos, organismos aquáticos, vegetais e para a fauna são suficientes para que se mantenha proibido o uso destas substâncias nas nossas UCs.
A legislação é ainda proibitiva. O DECRETO Nº 84.017, DE 21 DE SETEMBRO DE 1979. que regulamenta os Parques Nacionais determina que sejam proibidas quaisquer a utilização de substâncias que causem modificações nos ecossistemas dos Parques. A Portaria do Ibama, que permite o uso de herbicidas em ambientes naturais não é suficiente para que seja autorizada a aplicação destes venenos nos Parques Nacionais.
Anexei importantes informações também científicas sobre os malefícios do Roundup . Leiam, busquem mais informações e se forem convencidos mudem este rumo!
Não existe unanimidade de opinião no meio científico sobre a utilização de herbicidas para o controle das espécies invasoras em áreas protegidas. Ocorre um verdadeiro pânico com relação as invasões biológicas e subestimam-se os efeitos dos herbicidas, principalmente com base nas informações fornecidas pelas agroquímicas que têm interesses comerciais óbvios.
É claro que desejo que os responsáveis pela decisão do ICMBIO repensem e tentem outras formas de controle das espécies invasoras. Já não restam espaços sem venenos. Tais venenos são mutagênicos, alergênicos, promovem uma bagunça na dinâmica dos ecossistemas, predação de plantas por insetos e ataques de organismos patogênicos, dentre tantos efeitos por ser desvendados. Os que decidiram pelos venenos estão voltados para os improváveis benefícios de uma desastrosa tentativa de erradicação das gramíneas invasoras e simplesmente desconsideram os efeitos deletérios do roundup para toda a complexidade da vida nas nossas UCs.
Nada é medido ou monitorado sistematicamente. Aplica-se o veneno, observa-se a desejada mortalidade das espécies alvo e nada mais.
O que estão fazendo no Parque Nacional dos Aparados da Serra e o que estão prestes a fazer no Parque Nacional das Emas não tem retorno e se traduz em um precedente nocivo para todas as Unidades de Conservação deste país.
Por todos os argumentos aqui apresentados, rogo que o uso de venenos em nossas UCs sejam proibidos e que métodos ecológicos e socioambientais sejam a base das ações do ICMBIO para controle e mesmo erradicação das espécies exóticas invasoras.
Brasília, 25 de abril de 2011.
Paulo Cezar Mendes Ramos Ph D
Analista ambiental
Parque Nacional de Brasília